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quinta-feira, abril 01, 2010

Fronteira

A fronteira entre o receio/medo e o preconceito/discriminação é muito estreita e frágil. E hoje, eu percebi melhor isto, tentarei explicar para você.

Eu tenho a audácia de dizer que sou uma pessoa que não discrimina ninguém. Acho hipocrisia dizer que alguém não é preconceituoso, pois todos nós, sem exceção, somos. Mas isso é discussão para um outro momento.

Limitar-me-ei a descrever o que aconteceu hoje, poucas horas atrás.

Estávamos, eu e mais três amigos, conversando em uma praça próxima a um metrô. Quando fomos abordados por um senhor, morador de rua, pedindo ajuda.

Inicialmente, pensei nele sendo mais um dos muitos que nos abordam diariamente. Estava, até então, decidida a não contribuir, já que não tenho mesmo o costume de fazer isso, pois tenho receio de estar alimentando o vício de alguém. Mas, aos poucos, com sua sinceridade comovente e olhar desprovido de malícia, conquistou não só a mim, como aos meus amigos também.

Na tentativa de ajudar, reviramos nossas mochilas e carteiras, encontrando, no entanto, apenas poucas moedas.

Meu amigo então, disse: “Espera, não é dinheiro para comprar comida para os seus filhos que o senhor precisa?”.

“Sim. É isso mesmo, jovem”. Respondeu aquele senhor, que me surpreendeu por falar tão bem, contrastando com sua condição de vida.

“Que tal então, nós irmos àquela mercearia que tem aqui perto? Podemos ajudar o senhor lhe comprando comida.” Sugeriu meu admirável amigo, enquanto eu pensava: “É claro! Como eu sou burra por não ter pensado nisso também”.

Conversamos sobre todas as possibilidades de melhoria de vida dele e de sua família, sugerimos onde ele poderia procurar serviço, o que ele mostrou estar deveras interessado. E ouvimos um pouco de sua história também. Comovente como muitas outras que conhecemos.

Na mercearia, compramos pães, pacotes de biscoitos recheados, caixinhas de cenouras e feijões pré-cozidos e um pacote de balas de yogurt, para fazer um agrado para as crianças dele.

Quando entregamos as sacolas, ele mostrou-se realmente emocionado, nos agradeceu muito, dizendo que éramos os primeiros a ter feito uma coisa dessas para ele.

Mesmo envergonhado pela sujeira em suas roupas e mãos, nos pediu um abraço como forma de agradecer o que estávamos fazendo. Muitos, é claro, ficariam com nojo de abraçá-lo – como quem abraça um amigo, alguém que mora nas ruas e que mal conhecemos.

Entretanto, não pensamos nisso, abraçamos aquele senhor, que finalmente se apresentou. Um angolano (quase sem sotaque) que atende pelo nome de Johny ou João, como ele próprio disse.

Despedimos-nos, desejando bênçãos de Deus uns para os outros, e fomos embora.

No caminho de volta, comentei sobre a semelhança da situação com o livro O Vendedor de Sonhos de Augusto Cury. E meu amigo lembrou-se do que costumam dizer, que Jesus aparece na forma de pessoas pobres para testar nossa bondade. Enfim, qualquer que seja a crença, o importante é seguir “Fazer o bem sem olhar a quem” em todos os sentidos que esta frase proporciona.

Bem, viemos conversando sobre o ocorrido, torcendo para que tenhamos ajudado Johny e sua família e para que ele consiga mudar o curso de sua história. Falamos também sobre política, as atitudes do ser humano, problemas urbanos e suas soluções.

No entanto, o que me prendeu mesmo em uma reflexão foram as possibilidades: e se o tivéssemos discriminado desde o princípio? Não teríamos ajudado... O que nos fez dar “confiança” para que ouvíssemos o que ele tinha a dizer? Será que conseguiríamos fazer mais pela sociedade em que vivemos se nos despisse dos preconceitos e discriminações e prestássemos atenção na existência, carência e necessidades de pessoas como Johny?

Se tivéssemos ignorado a realidade que veio nos abordar hoje, não teríamos vivido essa grande experiência e reforçado a convicção de que enxergamos o mundo da maneira correta.

Dias como o de hoje me lavam a crer, cada vez mais, que a melhoria da nossa sociedade está mais em nossas mãos, pensamentos e atitudes do que somos capazes de imaginar.

O acontecimento aqui descrito abre um leque enorme para inúmeras reflexões e discussões, mas por agora, pararei por aqui!

Fiquei muito feliz por todos esses acontecimentos e o que eles me proporcionaram, e agradeço muito por isso. E termino este texto com o sentimento de esperança de que dias como este, se repitam muito em minha vida!

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